Por Rodrigo Capella*
Antes mesmo de assistirem a “Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal”, os críticos, muitos deles jornalistas, já teciam comentários favoráveis à nova película, protagonizada por Harrison Ford. Houve quem comentasse, inclusive, que esse filme é tão importante para 2008 quanto “2001: Uma Odisséia no Espaço” marcou o lendário 1968. Como se não bastasse essa bobagem, li também que a atuação de Ford é tão intensa que nos remete a uma reflexão racial e social. E mais: compararam “Indiana Jones....” a marcas de carro e perfume, como se o cinema, mesmo de estrelas, fosse tão desejado quanto um CK One ou um Paco Rabane.
Tais comentários assustadores e lamentáveis foram escritos, em jornais de circulação nacional, antes da realização da tradicional cabine de imprensa de “Indiana Jones..” – na qual profissionais de imprensa assistem ao filme antes do grande público. Ou seja, o jornalista-crítico deixou-se levar pelos bons filmes da série e, em muitos casos, apontou essa como a melhor história de Indiana.
Puro erro! O longa diverte o público, tem bons momentos de aventura, mas não pode ser considerado uma película exemplar. O roteiro é o mais fraco dos Indianas e, acredite se puder, tem falhas de sincronismo. Longe, portanto, de ser comparado ao clássico “2001...” e aos perfumes CK One e Paco Rabane, que mantém a mesma essência do começo ao fim do frasco.
A melhor leitura que pode ser feita dessa aventura é um pouco árdua para a mídia, talvez por isso ainda não tenha sido publicada. O personagem, na verdade, representa a “ética” e com sua arma, o chicote envenenado de raiva, tenta a todo custo combater os desvios e interpretações equivocadas da imprensa. Os inimigos que Indiana enfrenta são os “rusos” porque essa foi, aparentemente, a forma encontrada para mostrar que os jornalistas, ao errarem, contrariam a lei da moral e dos bons costumes, prejudicando toda uma sociedade.
Quem não se lembra, por exemplo, do Caso Escola de Base, na qual educadores foram erroneamente acusados de assediar crianças? Resultado: a escola foi depredada, os educadores quase foram presos e a mídia recebeu apenas alguns processos isolados. Casos como esse, infelizmente, são comuns e enquanto eu estava escrevendo esse artigo, mais um ocorreu: a mídia divulgou que um avião da empresa Pantanal havia caído em São Paulo. Mentira! Na verdade, uma loja que vende colchão havia expludido.
Percebeu a disparidade? Pois é, a empresa aérea foi prejudicada sem ter qualquer culpa e a sociedade entrou em estado de alerta, sem ter necessidade. Só quem, realmente, estava em São Paulo soube o que ocorreu: desespero, tumulto e muita gente ansiosa, buscando informações sobre os passageiros do acidente mentiroso.
Uma barriga (notícia mentirosa) como essa teria sido, facilmente, combatida com o chicote de Indiana, ferrramenta necessária contra o lead (primeiro parágrafo de um texto) mentiroso. Necessária também para evitar que, na redação, a emoção supere a razão e para não permitir que filmes medianos sejam transformados em verdadeiros clássicos, antes mesmo de serem vistos. Chicotadas nos jornalistas, já!
(*) Rodrigo Capella é jornalista, escritor e poeta. Autor de vários livros, entre eles “Transroca, o navio proibido”, que está sendo adaptado para o cinema, e “Rir ou chorar”, que desvenda os bastidores do cinema brasileiro. Informações: http://www.rodrigocapella.com.br/