Por Rodrigo Capella*
“Onde Andará Dulce Veiga?” é o novo filme do cineasta Guilherme de Almeida Prado, e também o melhor deles. O longa, focado a princípio na tara sexual, nos remete aos antecessores “A Dama do Cine Shangai” e “Flor do Desejo”, mas, no decorrer das cenas, o trabalho ganha em qualidade por se mostrar mais ousado e conflitante.
O diretor, que teve forte atuação no período da Retomada, rejeita o estereotipo de jornalista que toma café a cada cinco minutos e traz um profissional de comunicação que aprecia pó e maconha. E mais: é tímido, não gosta de se expressar, tem conflitos internos e anda como se fosse um rato atrás do queijo humano.
É possível, claro, encontrar semelhanças como outros filmes, o que poderia diminuir de primeiro impacto a grandiosidade da película. Entretanto, ocorre o inverso. Guilherme soube, meio que inconsciente, buscar elementos ocultos em obras-primas, como “A montanha dos sete abutres”, filme também protagonizado por um jornalista. Desempregado devido a sua conduta questionável, o personagem vai ao estado do Novo México atrás de uma grande matéria. Em “Onde Andará Dulce Veiga”, o jornalista Caio também está a procura, mas de alguém e não de algo. Afinal, a musa que dá nome ao filme está desaparecida há vinte anos. Se encontrar Dulce Veiga, o jornalista terá um furo de reportagem, o maior de sua carreira.
O furo de reportagem é, aliás, o que motiva o jornalista. Sem novidades, o profissional se acomoda e não aprecia o próprio trabalho. Foi o que aconteceu, por exemplo, com Locke, o protagonista do filme ítalo-francês “Profissão: Repórter”. A história narra a rotina de um homem aventureiro, mas angustiado; cansado por registrar as mesmas coisas e sem perceptivas de mudanças. Locke se comporta como um verdadeiro prisioneiro de sua câmera, capaz de registrar lugares indescritíveis e de, em alguns momentos, esconder o aparente sofrimento.
Caio, de “Onde Andará....”, também está angustiado, mas não pela profissão; sim por Dulce Veiga. E ele, diferente de Locke, é capaz de tudo para concretizar a sua façanha, indo até a Floresta Amazônica e atravessando rios a dentro. Assim como Caio, o jornalista de “A montanha dos sete abutres” enfrenta tudo e todos e acaba por encontrar uma grande matéria: um homem preso em velhas ruínas indígenas, justamente na Montanha dos Sete Abutres. Mas, nesse caso, o jornalista drogado de “Onde Andará...” dá lugar a um jornalista frio e calculista: Ele, por exemplo, manipula o xerife para entrar nas ruínas e convence até a mulher da vítima a fazer uma apresentação teatral para lamentar o sofrimento do marido. Quando o soterrado está próximo de ser salvo, o jornalista convence as autoridades para eles demorarem mais. Resultado: a vítima morre de pneumonia e provoca remorso no jornalista.
Em “Onde andará...”, Caio também fica com remorso, mas com o remorso de ter encontrado “Dulce Veiga”. Por longos minutos, ele fica frente a frente com a Diva sem saber o que fazer – praticamente imóvel. E quando pronuncia algo, já é tarde: Dulce não quer dar respostas, ela quer apenas fazer perguntas e deixar o tempo passar. Assim como o escritor Raduan Nassar, que surtou após publicar o best-seller “Um Copo de Cólera” e ser muito assediado pela mídia, a diva Dulce desaparece durante as filmagens de seu mais novo trabalho e vai se esconder na mata. Seria ela a alma do jornalista angustiado ou apenas uma diva que se esconde dos jornalistas manipuladores para sobreviver?
(*) Rodrigo Capella é escritor, poeta e jornalista. Autor de vários livros, entre eles “Rir ou Chorar”, que desvenda os bastidores do cinema brasileiro. Mais informações: http://www.rodrigocapella.com.br
“Onde Andará Dulce Veiga?” é o novo filme do cineasta Guilherme de Almeida Prado, e também o melhor deles. O longa, focado a princípio na tara sexual, nos remete aos antecessores “A Dama do Cine Shangai” e “Flor do Desejo”, mas, no decorrer das cenas, o trabalho ganha em qualidade por se mostrar mais ousado e conflitante.
O diretor, que teve forte atuação no período da Retomada, rejeita o estereotipo de jornalista que toma café a cada cinco minutos e traz um profissional de comunicação que aprecia pó e maconha. E mais: é tímido, não gosta de se expressar, tem conflitos internos e anda como se fosse um rato atrás do queijo humano.
É possível, claro, encontrar semelhanças como outros filmes, o que poderia diminuir de primeiro impacto a grandiosidade da película. Entretanto, ocorre o inverso. Guilherme soube, meio que inconsciente, buscar elementos ocultos em obras-primas, como “A montanha dos sete abutres”, filme também protagonizado por um jornalista. Desempregado devido a sua conduta questionável, o personagem vai ao estado do Novo México atrás de uma grande matéria. Em “Onde Andará Dulce Veiga”, o jornalista Caio também está a procura, mas de alguém e não de algo. Afinal, a musa que dá nome ao filme está desaparecida há vinte anos. Se encontrar Dulce Veiga, o jornalista terá um furo de reportagem, o maior de sua carreira.
O furo de reportagem é, aliás, o que motiva o jornalista. Sem novidades, o profissional se acomoda e não aprecia o próprio trabalho. Foi o que aconteceu, por exemplo, com Locke, o protagonista do filme ítalo-francês “Profissão: Repórter”. A história narra a rotina de um homem aventureiro, mas angustiado; cansado por registrar as mesmas coisas e sem perceptivas de mudanças. Locke se comporta como um verdadeiro prisioneiro de sua câmera, capaz de registrar lugares indescritíveis e de, em alguns momentos, esconder o aparente sofrimento.
Caio, de “Onde Andará....”, também está angustiado, mas não pela profissão; sim por Dulce Veiga. E ele, diferente de Locke, é capaz de tudo para concretizar a sua façanha, indo até a Floresta Amazônica e atravessando rios a dentro. Assim como Caio, o jornalista de “A montanha dos sete abutres” enfrenta tudo e todos e acaba por encontrar uma grande matéria: um homem preso em velhas ruínas indígenas, justamente na Montanha dos Sete Abutres. Mas, nesse caso, o jornalista drogado de “Onde Andará...” dá lugar a um jornalista frio e calculista: Ele, por exemplo, manipula o xerife para entrar nas ruínas e convence até a mulher da vítima a fazer uma apresentação teatral para lamentar o sofrimento do marido. Quando o soterrado está próximo de ser salvo, o jornalista convence as autoridades para eles demorarem mais. Resultado: a vítima morre de pneumonia e provoca remorso no jornalista.
Em “Onde andará...”, Caio também fica com remorso, mas com o remorso de ter encontrado “Dulce Veiga”. Por longos minutos, ele fica frente a frente com a Diva sem saber o que fazer – praticamente imóvel. E quando pronuncia algo, já é tarde: Dulce não quer dar respostas, ela quer apenas fazer perguntas e deixar o tempo passar. Assim como o escritor Raduan Nassar, que surtou após publicar o best-seller “Um Copo de Cólera” e ser muito assediado pela mídia, a diva Dulce desaparece durante as filmagens de seu mais novo trabalho e vai se esconder na mata. Seria ela a alma do jornalista angustiado ou apenas uma diva que se esconde dos jornalistas manipuladores para sobreviver?
(*) Rodrigo Capella é escritor, poeta e jornalista. Autor de vários livros, entre eles “Rir ou Chorar”, que desvenda os bastidores do cinema brasileiro. Mais informações: http://www.rodrigocapella.com.br